"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Cidades, mercadores, escolas

Desembarque de mercadorias num porto medieval

Até o século XX, os europeus eram, em sua grande maioria, homens do campo. Não se deve esquecer que os atuais camponeses são os herdeiros de 90% da população europeia anterior ao desenvolvimento da indústria nos séculos XVIII e XIX. Mas, na Idade Média, nasceram ou se desenvolveram inúmeras cidades: as mais importantes eram as sedes do poder dos reis e dos príncipes, e também de sua burocracia. Elas tinham principalmente uma importante atividade econômica, com artesãos, mercados e feiras: as da Champagne foram bastante frequentadas nos séculos XII e XIII. Um novo tipo de homem apareceu, o mercador. Os mais ricos mercadores comerciavam em toda a Europa, e até mesmo na Ásia e na África, e eram também banqueiros. Os mais poderosos foram os italianos (florentinos, genoveses e venezianos), os flamengos e os alemães que se agruparam numa grande associação comercial: a Hansa de Londres e Bruges, em Anvers, Hamburgo, Lübeck, Dantzig (atual Gdansk, na Polônia) e Riga. A circulação da moeda de ouro e de prata tornou-se muito importante, mas havia muitas moedas (o florim de Florença e o ducado de Veneza eram as mais renomadas). A troca de moedas era complicada e a ausência de uma moeda única entravou o desenvolvimento de um sistema econômico baseado no dinheiro: o capitalismo.

As cidades foram também centros culturais. Elas criaram as escolas onde se ensinava os filhos dos leigos, sobretudo dos burgueses, a ler, a escrever e a contar. Em algumas cidades, as corporações de mestres e de estudantes fundaram escolas de nível superior: as universidades. Elas existiram na Grã-Bretanha (Oxford, Cambridge), na Espanha (Salamanca), em Portugal (Coimbra), na Boêmia (Praga) e na Polônia (Cracóvia). As duas mais célebres foram Bolonha, para o direito, e Paris, para a teologia. Estudava-se também medicina em Salerno e em Montpellier. Os estudantes e os mestres, que viajavam por toda a Europa de uma universidade a outra, suscitaram uma grande produção de livros manuscritos e inauguraram um novo sistema de promoção quando eram bem-sucedidos nos exames. [...] 

As cidades foram também centros artísticos. A partir do ano 1000, surgiu um novo estilo de arquitetura e de escultura: a arte românica. No século XII, foi nas cidades que a arte gótica sucedeu à arte românica e deixou a luz entrar nas igrejas por grandes janelas, e, sobretudo, a luz colorida, graças aos vitrais. O teatro, que desaparecera desde a Antiguidade, ali renasceu, as festas se multiplicaram, e a mais animada era o carnaval. Na cidade, enriquecia-se, aprendia-se e divertia-se o europeu. Mas houve também muitos pobres e malfeitores. A miséria e a delinquência urbana se desenvolveram.

LE GOFF, Jacques. Uma breve história da Europa. Petrópolis: Vozes, 2008. p. 77-79.

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