"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Habitações populares em São Paulo no início do século XX

Crianças engraxando sapatos, foto de Vincenzo Pastore

Sabemos que muito antes dos técnicos realizarem suas pesquisas como forma de qualificar o baixo padrão de vida dos operários e de propor a construção de moradias econômicas em São Paulo, estes já haviam se cansado de reivindicar o direito a melhores condições de vida na cidade. Lembramos que muitos operários e trabalhadores moravam em cortiços porque seus salários reduzidos não pagavam o alto aluguel exigido pelos proprietários da cidade. [...]

Na década de 1920, o Brás, a Mooca, o Bom Retiro, Belém, Belenzinho, Pari, Barra Funda, Água Branca, Cambuci, Ipiranga, Penha e Pinheiros constituíam os principais bairros operários de São Paulo. Neles, ao lado dos operários, habitavam outras categorias de trabalhadores, entre eles, os vendedores de leite de vaca e cabra, de lenha, de castanha, batata-doce, vassoura, amendoins, os tripeiros, pizzaiolos, alfaiates, amoladores de faca, pipoqueiros, compradores de ferro-velho, garrafas, sacos vazios, chumbo, metal e cobre.

Com os operários e os vendedores ambulantes viviam também os comerciantes, isto é, os donos de cantinas, padarias, sapatarias e chapelarias. Alguns comerciantes moravam com suas famílias em sobrados cuja parte térrea era utilizada para fins comerciais, tais como padaria, armazéns e lojas. A parte superior era utilizada como moradia para a própria família. Contudo, não eram os comerciantes a categoria que mais sofria com os altos aluguéis, dado que, muitos deles conseguiram comprar suas casas logo no início da formação dos bairros. O Brás foi um dos bairros populares que atraía vários imigrantes pela facilidade dos transportes, pelas oportunidades de trabalho e, sobretudo, pelo baixo preço dos terrenos, considerados insalubres devido às inundações. Mesmo sendo bairros novos, não estavam contudo isentos dos porões e cortiços. No Bexiga, até as décadas de 30 e 40, as famílias usavam o mesmo pátio, compartilhavam do mesmo vaso sanitário, a alimentação era feita nos seus próprios aposentos. Muitos cortiços possuíam: "... um corredor central onde se abriam as portas e janelas dos quartos que se alinhavam de ambos os lados".

Ao retratar as condições insalubres dos cortiços, seus moradores não esqueciam de enfatizar a existência de redes de solidariedade como forma de suportar a miséria em que viviam.

"Naquele tempo, o Bexiga já era o bairro dos cortiços. Num dos quartos dormíamos os seis irmãos, era apertado, havia ratos e baratas, mas não sentíamos a miséria, éramos no bairro uma grande família, onde todos se ajudavam. [...]"

CARPINTEIRO, Marisa Varanda Teixeira. Imagens do conforto: a casa operária nas primeiras décadas do século XX em São Paulo. In: BRESCIANI, Stella (org.). Imagens da cidade - séculos XIX e XX. São Paulo: ANPUH/Marco Zero/Fapesp, 1994. p. 141-142.

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